segunda-feira, 25 de outubro de 2010

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A chuva parou na caneca vazia. Vazia como estas mãos que escorregam pelos olhos úmidos, que imagem interessante aquela. Como pudera? Pequeninos cacos que vidro espalhados por todo chão, azulejos rubros de hemácias, onde estivera? Onde estivera sua consciência quando escorregaram os dedos firmes na pele branca? Os dedos? Não os dedos, os cacos. De seus olhos? Que importa! Agora tudo é névoa. Sem chuva, sem lágrimas... E o brilho? Que brilho? Besteiras folclóricas, não há brilho depois da escuridão, depois do vermelho latente. Há apenas o vácuo. E os sons? Estão chegando os sons do horizonte, posso vê-los voando pelo céu. Não se pode ver os sons querida... Claro que sim, eles estão lá, oscilando num turbilhão, tão bonito olhar daqui. O baixo tem a forma de um beijo. O beijo que nunca mais sentirá. Nunca? Não. Estranho, percebo agora que o grito de angústia é vermelho e voa tão mais rápido que o baixo...

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Trecho a ninguém

O chá esfriara nos últimos dedos da caneca velha e manchada e as folhas continuavam em branco, a caneta jogada e destampada esfriara nos locais de pressão da mão humana e alva que por sua vez descansava no mogno sem brilho do tampo da mesa. "Os anos passam rápido sobre a planície ofuscante do espelho, cada dia reflete um homem que foge de si mesmo e esconde um mundo de escuridão suspenso no vácuo de uma carcaça epidérmica", não sabia exatamente quando havia lido, mas as palavras martelavam em sua cabeça e bloqueavam qualquer tentativa de criar. Estava velho, preso em suas escolhas solitárias feito uma pedra plantada no chão de cimento. Cada gota da chuva ácida de culpa acumulada durante anos corroía-lhe a pele, sua face deformou-se, virou um espectro, uma idéia horrenda dos sentimentos mais pesados e seu corpo não se movia, a mão grudara no mogno e assim permaneceu. Dia após dia, noite após noite e as sombras iam e vinham naquela imagem vazia de Ninguém deformado. Suas folhas em branco ecoavam em perfeita sintonia com aquelas palavras que não paravam de martelar...
Eu amo, sinto saudades, mas há algo quebrado que espeta minha carne. Olho para trás e não sei como cheguei até aqui, deste jeito, as portas se abrem, o vento sopra e eu estou ainda imóvel. Quero gritar, mas minhas boca está costurada, eu amo e as vezes não tenho coragem de esticar-me e envolver este amor com toda minha personalidade. Amo e choro quando estou distante, porém tenho medo de ser incompreendida, de ser motivo de temor. Será possível que talvez eu o assuste com todo sentimento adormecido que talvez volte a desenvolver? Os poemas no meio da noite, os sonetos com seu nome, as cartas... Será que ele seria capaz de esquecer minhas cartas? Tenho medo de escrevê-las. Tenho medo de explodir em emoções. Tenho medo de voltar a ser o que era.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Não me deixe...

Não me deixe, não aqui no vazio, nestas paredes brancas que ferem meus olhos. Não! Não me deixe sozinha com meus pensamentos atormentados, sozinha comigo, por favor, não me deixe! Não solte minha mão, pois meus dedos apodrecerão no ar da solidão. Não largue meu corpo na cama fria, pois minha pele quebrará como a camada frágil de gelo sobre a água. Não, por favor não me deixe! A rosa de minhas faces morrerá pálida sem seu toque, meus lábios secarão sem os seus, não me deixe no mar da desilusão, não me afogue em minhas lágrimas secas. Que será deste rosto morto em frente aos espelho? Como encarar os olhos de vidro partido, os cabelos opacos e a pele transparente? Que será do suspiro de vida melancólico, o último: Não me deixe!